A solidão e os fones - Cidade Marginal

Breaking

Home Top Ad

Responsive Ads Here

quarta-feira, 9 de março de 2016

A solidão e os fones



Um dia desses eu estava a caminho do Benfica (um bairro que sempre frequento aqui em Fortaleza principalmente por causa da cerveja gelada) e me deparei com uma letra de uma música que ouvia com meus fones de ouvido:

A solidão e os fones das pessoas na estação
E um labirinto pra se livrar da dor
A força imensa dos que ainda podem
Se alegrar
Guiam de forma branda os seus corações

A música se chama "dança diferente" da banda baiana Maglore. E foi a maior identificação que tive com uma música em anos (tirando "te encontra logo") e percebi que eu fazia a mesmíssima coisa. E continuo fazendo e fazendo e fazendo.

Todo santo dia quando pego o ônibus seja pra ir pra faculdade ou pra encontrar algum amigo, seja pra pagar conta ou simplesmente fugir desse incômodo, seja pegando um avião ou seja caminhando pela avenida todos os dias eu estou na minha solidão em meio as ruas de Fortaleza. Sozinha com meus fones de ouvido. Ouvindo músicas, tentando criar um mundo imaginário em minha cabeça enquanto o mundo real passa diante dos meus olhos e eu não vejo. Fecho os olhos e me imagino longe daquele lugar, com pessoas diferentes, com sorrisos diferentes, com histórias diferentes. Mas nunca estou ali de fato. Eu não presto atenção ao que está ao meu redor. Eu simplesmente me desligo da vida.

Seria errado tudo isso?

Seria errado viver uma realidade que está em nossas cabeças e continuarmos sozinhos, solitários, viciados em aplicativos de relacionamento? Quando a pessoa que senta ao nosso lado no ônibus ou metrô pode ser quem faça acontecer acontecer? Quando quem olha pra gente de canto de olho pra tentar descobrir que música toca em nossa mente, perguntando horas para puxar assunto, sendo que estamos lá sozinhos em nossa solidão e nossos fones. Vivemos de forma tão errada que não conseguimos perceber que, na verdade, quem rege nossa vida são ideias pré-formadas em nossas cabeças. Ideias que criamos e recriamos em nossas mentes quando ouvimos nossas músicas favoritas. Nos tornamos cada vez inacessíveis. E pessoas inacessíveis não são as pessoas com quem queremos ter.

Perceber que somos sozinhos em nossos mundos e inacessíveis é um tapa em nossa cara. Será que nos tornamos a geração mais solitária que o planeta já viu? O mundo não suporta tantos mundos imaginários enquanto a vida passa. E atrasamos cada vez mais nossa vida pois não nos encontramos de fato. Estamos criando diálogos, cenas, pessoas, sentimentos e até realizações em nossas mentes. E sempre nos decepcionamos porque as pessoas não são como a gente imagina.
Poucas vezes na vida pude ver uma realização na vida real de tudo aquilo que penso enquanto estou a caminho da cerveja.

Ontem peguei um ônibus para ir a casa de uma amiga e eu estava ouvindo música nos fones. Desci na parada, atravessei a rua presa em meus pensamentos absolutos. Imaginando cenas e mais cenas sobre como seria bom se alguma coisa acontecesse. Algo novo, surpreendente, leve. Que me tirasse dessa minha melancolia ruim. E eu até entendo o motivo de querer ficar com os fones de ouvidos o dia todo em todo lugar. A vida as vezes pode ser uma merda. Briga dos pais, separação, divisão de bens, faculdade, emprego, projetos e as vezes você só quer cantarolar uma música em sua mente. Os dias não são fáceis e quando a gente coloca o fone, muitas vezes esquecemos que nem tudo pode ser perdido.

O problema está quando você está tão absolvido nesse mundo imaginário que esquece que a vida continua. Que depois dessas discussões vem a paz, que depois da decepção vem o entendimento, que depois do coração quebrado vem outro amor (pode demorar). Mas sempre vem. Sempre virá.
E ontem, enquanto estava querendo ser outra pessoa, ter outra história, pensando em ter feito o passado diferente, deixei que o passado entrasse em minha mente e me atormentasse, E não valeu a pena.

A minha luta é pra que eu consiga superar todas esses problemas e consiga sair pelo menos ilesa, ou não totalmente desgraçada da cabeça. E parar de sonhar tanto e viver a vida de fato. É isso que falta.

Mas sei que quando sair daqui, a primeira coisa que farei é colocar os fones de ouvido e ir pros meus compromissos diários. Sou viciada em sonhar.

Um comentário: